quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

UMA IMAGEM NÃO VALE UMA VIDA

 MARILYN

A Mãe Biológica de Marilyn Monroe, peça de Nascimento Rosa, interpretada por alunos do Curso Profissional de Artes do Espectáculo - Interpretação (12.º 13), no âmbito da Prova de Aptidão Profissional. Encenação: Gonçalo Barata. Captação de imagem e montagem do vídeo: São Ludovino. Lisboa, 28/6/2019.

(Este pequeno artigo é apenas a introdução de um longo projecto que se traduziu na recolha de muita e diversificada informação e na escrita de cerca de 200 páginas de texto. Nunca poderia publicar aqui esse longo texto. Além do mais, teria de rever muitos dos capítulos por serem polémicos e, em alguns casos, por necessitarem de maior fundamentação. Da vasta bibliografia e webgrafia compilada também fica aqui apenas uma pequena parte).

     «It takes me 5 hours to become Marilyn». Estas palavras de Marilyn (1926-1962) perturbam, sobretudo porque revelam o abismo entre Norma Jean, a rapariga alegre e sonhadora, e a estrela Marilyn Monroe aprisonada pelo seu próprio sonho. Marilyn referia-se ao cuidado extremo que colocava na construção da sua imagem e da personagem omnipresente que acabava quase sempre por se sobrepor a todas as personagens que encarnava e sobressaía como símbolo.

     Adoptou o nome artístico Marilyn Monroe em 1946, mas só dez anos depois começou a usá-lo oficialmente, como se já não fosse possível voltar a ser quem era. Norma Jean tinha de ser apagada para Marilyn nascer e brilhar em todo o seu esplendor. Antes, já usara o nome artístico “Jean Norman”. 

Marilyn Monroe - Composition 1 by Richard Avedon, 1958.

     Ser Marilyn tornou-se um vício, uma personagem que não podia despir ao fim do dia. Ser Marilyn era um atalho para a celebridade, mas nunca foi verdadeiramente um caminho para a felicidade. Apesar dos mil sorrisos que distribuiu pelas audiências e deixou impresso em milhares de fotografias, Marilyn nunca foi verdadeiramente feliz. Um ser fragmentado, interiormente dividido, dificilmente consegue ser feliz. 

     Muito mais do que uma infância instável e algo traumática, o que mais marcou a vida de Marilyn foram as suas escolhas, a sua relação com a sua própria imagem e a busca infrutífera (ou não) por um amor total e incondicional. Na verdade, Marilyn teve esse amor em Joe Di Maggio (com quem casou em 1954) mas o apelo do cinema, da vida de estrela, permanentemente adorada e desejada foi mais forte. Joe Di Maggio foi o único que continuou a respeitar e honrar Marilyn mesmo depois de morta. Durante cerca de 20 anos, após a morte de Marilyn, foi visitar o seu túmulo acompanhado por um bouquet de rosas vermelhas. 

     Em muitos aspectos, Marilyn foi o cordeiro atraído para o covil dos lobos de Hollywood. O deslumbramento com o glamour de Hollywood entranhou-se na sua mente quando era apenas uma criança. A actriz que mais admirava, Jean Harlow (1911-1937), tal como ela, teve também uma morte súbita e trágica (causada por uma insuficiência renal fulminante) aos 26 anos, quando estava no auge da sua carreira. 

Jean Harlow (born Harlean Harlow Carpenter; March 3, 1911 – June 7, 1937).

     Percebeu cedo que para chegar ao topo tinha de construir uma imagem. Consciente da sua beleza natural, apostou desde cedo no uso dos seus atributos físicos para chegar às luzes da ribalta. Foi modelo fotográfico, capa de revistas de entretenimento e artes do espectáculo e “coelhinha” da Playboy. Pelo caminho, foi advertida inúmeras vezes sobre a voracidade dos “lobos de Hollywood” e sobre a fugacidade do estrelato. Marilyn tinha consciência de todos esses riscos e perigos, mas o impulso para brilhar mais alto foi sempre mais forte. 

     Marilyn foi frequentemente usada e manipulada, no plano profissional e pessoal, não por ser absolutamente ingénua mas por falta de autoconfiança e experiência. Por isso, tentou aprender e rodear-se de gente que orientasse e organizasse a sua carreira e a vida pessoal. Confiava nessas pessoas mais do que em si própria; um erro que lhe custaria caro. Frequentou o Actors Studio e aceitou a protecção do casal Lee e Paula Strasberg. Lee Strasberg foi um pioneiro e revolucionário nos métodos de ensino na arte de interpretar do Actors Studio; a mulher coadjuvava-o e ensinava seguindo os mesmos métodos. Lee Strasberg criou uma ligação muito estreita com Marilyn durante os oito anos em que conviveram e esses laços e influência continuaram até ao final da vida da actriz. Paula Strasberg, segunda mulher de Lee, actriz e professora de arte dramática, acabaria por tornar-se uma espécie de manager (gestora de carreira) e acting coach (mentora e directora artística) de Marilyn, acompanhando-a por toda a parte. No segundo testamento de Marilyn, redigido pouco antes da sua morte, a actriz deixa 75% do seu património a Lee Strasberg, assim como os direitos de imagem. Lee Strasberg deixaria todo esse património à sua terceira mulher, Anna Strasberg (actriz), que continuou a administrar o espólio de Marilyn até parte dele ser vendida pela Christie’s em 1999 por 12,3 milhões de dólares. 

Amy and Joshua Greene with Paula Strasberg (center) and Marilyn during filming of ‘Bus Stop’, 1956.

     Marilyn não prescindia da orientação de Paula Strasberg. Só aceitava ou recusava um papel depois de ouvir a sua opinião; e só entrava em cena após uma longa preparação com Paula e só se esta a autorizasse a fazê-lo. A influência sobre Marilyn era tal que alguns realizadores (Billy Wilder) se queixavam de não conseguir realizar os seus próprios filmes com Marilyn quando Paula Strasberg estava presente, por vezes no próprio set de filmagens, dando as suas próprias orientações a Marilyn. Esta óbvia dependência de Paula e a incapacidade de cumprir horários ou planos levou Billy Wilder a considerar que Marilyn era apenas uma criança mimada, irresponsável, mal-educada e perversa. 

Arthur Miller, Marilyn Monroe, Paula Strasberg, 1957 by Richard C. Miller.

     Outros realizadores tinham opiniões semelhantes (George Cukor) e lamentavam que Marilyn não conseguisse organizar e orientar a sua própria vida nem trabalhar com profissionalismo. Para além de faltar sem aviso às filmagens e chegar sistematicamente com várias horas de atraso, Marilyn exigia que tudo fosse feito com um ritmo que era exclusivamente seu. Vários actores com quem contracenou queixaram-se da forma de trabalhar caprichosa e caótica de Marilyn. Há relatos de Jack Lemmon e Tony Curtis sobre as filmagens de Some Like It Hot (Quanto Mais Quente Melhor, 1959) realizado por Billy Wilder. Marilyn não chegou a horas uma única vez, atrasava-se 2, 3, 4, 5 horas e depois gravava apenas durante cinco ou dez minutos ou nem chegava a gravar.

Tony Curtis Talks About Marilyn Monroe. 

     Apesar das muitas críticas que lhe são feitas, e de ser considerada por muitos uma actriz medíocre, muitos (incluindo os que a criticavam) reconhecem que, em certos momentos, sempre imprevisíveis, Marilyn conseguia ser genial, imprimia uma marca forte à interpretação e era absolutamente única. Eram talvez os momentos em que Marilyn era mais o ser humano e menos uma actriz formatada pelos figurinos impostos pela indústria. Só não conseguia manter essa autenticidade e espontaneidade, estudadas ou não, durante muito tempo. Marilyn, a imagem, acabava quase sempre por vencer. 

     No entanto, todos estavam cientes do quão “preciosa” Marilyn era, como vendia bem a sua imagem e os filmes que protagonizava. Apesar dos muitos prejuízos causados, Marilyn acabava quase sempre por compensar largamente a indústria cinematográfica. A imagem de Marilyn era apelativa e lucrativa. O sex symbol vestido de roupagens ingénuas e sensuais agradava sobretudo a um público masculino que pouco se importava com a qualidade dos filmes ou a condição feminina. Marilyn tornou-se mulher-imagem, mulher-objecto. Aí começou a sua tragédia. 

     Sobre a sua morte construíram-se inúmeras teses e teorias da conspiração, algumas algo credíveis, outras completamente absurdas. Suicídio, homicídio, morte natural ou acidental? 

     A morte natural é a hipótese menos credível, mas a morte acidental é admissível e tornou-se uma das versões oficiais dos factos: “intoxicação acidental por barbitúricos”. A outra versão dominante defende que Marilyn se suicidou com uma “overdose de barbitúricos”, fundamentada habitualmente com tentativas de suicídio anteriores também por overdose e a propensão de Marilyn para a depressão, a instabilidade emocional e as mudanças súbitas de humor. 

     Marilyn tinha, de facto, uma longa história de dependência do álcool, de drogas, barbitúricos e outros medicamentos, que se agravou após a separação de Arthur Miller (terceiro casamento, 1956-1959). As facturas dos últimos dias de vida assustam, tal é a quantidade de substâncias que estava a ingerir, todas prescritas pelos seus próprios médicos. Ralph Greenson, o seu psiquiatra, tinha sobre Marilyn um ascendente ainda mais forte e perigoso do que Lee e Paula Strasberg e contrariava na prática clínica o que advogava em teoria. Nos seus escritos, defendia que o terapeuta deve manter uma distância física e emocional dos seus pacientes. Na prática, tinha um convívio próximo e constante com Marilyn. Além disso, a sua terapia fez-se sempre acompanhar da ingestão de diversos psicotrópicos e em grandes quantidades. 

Ralph Greenson and his wife. 

     A tese do suicídio é admissível, mas existem também muitos indícios que a contrariam. O próprio relatório da autópsia deixa muitas questões em aberto. Por exemplo, como é possível encontrar uma das substâncias (hidrato de cloral) que a terão matado nos intestinos mas não no estômago ou no trato digestivo superior? Como é que essa substância entrou no seu organismo em quantidades tão elevadas? E como é que a enorme quantidade de pentobarbital entrou na sua corrente sanguínea e no fígado? Curiosamente, a própria investigação criminal parece ter ignorado tais factos ou nunca os conseguiu esclarecer devidamente… 

     A tese do homicídio é a mais complexa, polémica e delicada, apontando em direcções muito diversas. Os documentos da CIA e do FBI (desclassificados há poucos anos) indicam a curiosa ligação de Marilyn a certas actividades políticas consideradas subversivas, como o encontro com uma “célula” comunista no México. Vivia-se ainda na altura da chamada “Caça às Bruxas” (liderada pelo senador Joseph McCarthy, McCarthysm) que encontrou em Hollywood muitos dos seus suspeitos e alvos. Sem referir explicitamente o nome de Marilyn, em 1956, Walter Winchell, um conhecido jornalista de Nova Iorque, afirmou que Marilyn convivia com a “intelligentsia de esquerda”. Publicamente, Marilyn nunca foi alvo de qualquer inquérito. O FBI presume que Winchell se referia a Marilyn quando fala da "loura mais famosa do cinema" e da sua ligação com Arthur Miller, ainda antes do casamento: 

Winchell escreveu: «And the fact that Americans best known blonde moving picture star is now the darling of the left Wing intelligentsia, several of whom are listed as red frontiers. I do not think she realizes it.» 

Comentário do FBI: «This possibly refers to Marilyn Monroe. A recent news article concerning the divorce action between Arthur Asher Miller, prominent author, and his wife, reflected it was rumored Marilyn Monroe was linked romantically with Miller. On interview by newsmen both of them admitted friendship but denied any romantic ties. Miller is the author of “Death of a Salesman”. (Segmento rasurado). We have not conducted security investigation concerning Marilyn Monroe.» 

     Documentos do FBI e da CIA de 1955 revelam que Marilyn teria requerido na embaixada soviética um visto para viajar para a Rússia. A embaixada soviética teria recebido uma carta do manager de Marilyn, datada de 8 de Agosto de 1955, fazendo este pedido e estaria a ponderar a concessão de uma autorização. 

     Um documento do FBI de Junho de 1962 (dois meses antes da morte de Marilyn) revela o encontro de Marilyn com amigos do partido comunista americano no México: 

     «This source advised that MARILYN MONROE, the movie actress, was recently in Mexico on vacation and while in Mexico associated closely with certain members of the American Communist Group in Mexico (ACGM). Source characterized the ACGM as a loose association of a predominantly social nature of present and/or past members of the Communist Party, USA, and their friends and associates who share a common sympathy for Communism and the Soviet Union.» 

Comrade Marilyn - A Most Unlikely Communist by Peter Frost, June 2013.

     Alguns investigadores por conta própria insistem antes nas suas ligações à família Kennedy, não só John F. Kennedy mas também Robert F. Kennedy. Segundo documentos recentemente desclassificados, Marilyn terá estado grávida de Robert Kennedy mas terá abortado. Outros apontam antes para uma intervenção da Máfia (activamente combatida por Robert Kennedy enquanto Procurador Geral), a que Marilyn se terá ligado indirectamente através das suas estreitas relações com Frank Sinatra. Até o nome do cão ― Maf, abreviatura de Máfia ― oferecido por Frank Sinatra a Marilyn, serviu para suportar esta teoria. 

Marilyn Monroe with pet 'Maf Honey' (a gift from Frank Sinatra) 
at the Beverly Hills Hotel, 1961 by Eric Skipsey.

     Um dos casos mais interessantes de investigação sobre as mortes de J. F. Kennedy e Marilyn Monroe é o de Dorothy Kilgallen (1913-1965), jornalista, colunista e figura televisiva, que também apareceria misteriosamente morta logo após ter anunciado a publicação dos dados e testemunhos que recolhera. A própria cópia dos documentos, entregue a uma amiga próxima, também desapareceria. E essa amiga morreu também tragicamente pouco depois. Houve aliás quem tenha feito uma compilação de todas as mortes violentas ou por explicar de pessoas ligadas quer ao assassinato de J. F. Kennedy quer à morte de Marilyn, encontrando entre elas diversos fios condutores e pontos de contacto.

Marilyn with murdered journalist Dorothy Kilgallen.
Ao contrário de muitos outros colunistas, Dorothy nunca escreveu um artigo crítico contra Marilyn.
Na verdade, raramente se referiu a ela ou à sua carreira nos seus artigos. 
No entanto, por motivos desconhecidos, Marilyn detestava Dorothy.
Numa conversa privada com Truman Capote, Marilyn refere-se a Dorothy com palavras extremamente grosseiras (cf. Fifth Avenue - 5:00 A.M. de Sam Wasson sobre o making of the Breakfast at Tiffany's, realizado por Blake Edwards, o filme que acabou por ser protagonizado por Audrey Hepburn e não por Marilyn como Truman Capote, autor da obra (mas não do guião) e amigo de Marilyn tinha exigido). 

The Reporter Who Knew Too Much by Mark Shaw.

*************************************************************


A Mãe Biológica de Marilyn Monroe - Encenação de Gonçalo Barata

     O longo artigo que elaborei não é por ora aqui publicado, e provavelmente nunca será, não só por ser extenso mas também por abordar muitas questões delicadas e duvidosas.


********************************************

Filmografia:

1947 - Dangerous Years – Realizado por Arthur Pierson
1948 - Scudda Hoo! Scudda Hay! – Realizado por F. Hugh Herbert
1948 - Ladies of the Chorus – Realizado por Phil Karlson
1949 - Love Happy – Realizado por David Miller
1950 - A Ticket to Tomahawk – Realizado por Richard Sale
1950 - The Asphalt Jungle – Realizado por John Houston
1950 - All About Eve – Realizado por Joseph L. Mankiewicz
1950 - The Fireball – Realizado por Tay Garnett 
1950 - Right Cross – Realizado por John Sturges
1951 - Home Town Story – Realizado por Arthur Pierson
1951 - As Young As You Feel – Realizado por Harmon Jones
1951 - Love Nest – Realizado por Joseph M. Newman
1951 - Let's Make It Legal – Realizado por Richard Sale
1952 - Clash by Night – Realizado por Fritz Lang
1952 - We're Not Married! – Realizado por Edmund Goulding
1952 - Don't Bother to Knock – Realizado por Roy Ward Baker
1952 - Monkey Business – Realizado por Howard Hawks
1952 - O. Henry's Full House (The Cop and the Anthem) – Realizado por Henry Koster
1953 – Niagara – Realizado por Henry Hathaway
1953 - Gentlemen Prefer Blondes – Realizado por Hoard Hawks
1953 - How to Marry a Millionaire – Realizado por Jean Negulesco
1954 - River of No Return – Realizado por Otto Preminger
1954 - There's No Business Like Show Business – Realizado por Walter Lang
1955 - The Seven Year Itch – Realizado por Billy Wilder
1956 - Bus Stop – Realizado por Joshua Logan
1957 - The Prince and the Showgirl - Produzido e realizado por Laurence Olivier
1959 - Some Like It Hot – Realizado por Billy Wilder
1960 - Let's Make Love – Realizado por George Cukor
1961 - The Misfits – Com guião de Arthur Miller, realizado por John Houston
1962 - Something's Got to Give (inacabado) – Realizado por George Cukor 

************************************

Nota

     Além do seu verdadeiro nome (Norma Jeane Mortenson, normalmente reduzido a Norma Jean), Marilyn usou outros nomes artísticos: Jean Norman e Zelda Zonk, ambos anteriores a Marilyn Monroe. Zelda Zonk, inicialmente o nome escolhido por Norma Jean, foi usado sobretudo em sessões fotográficas em que aparece com uma cabeleira negra e uma maquilhagem que a fazia assemelhar-se a Jacqueline Kennedy. Colocou-se a questão de saber o que originara a construção desta personagem, que mais parecia uma caricatura: seria uma paródia da própria Jacqueline Kennedy? Mas porquê? Marilyn também usava este outfit quando queria sair anonimamente, mas nessas alturas habitualmente usava um lenço sobre o cabelo, óculos escuros e uma gabardine ou um casaco escuro… Usou o nome Zelda Zonk sempre que tentou manter o anonimato: sempre que ia a um médico, a um hospital psiquiátrico ou pretendia viajar sem atrair as atenções dos media. Numa viagem feita em 1954, entre Los Angeles e Nova Iorque, Marilyn viajou com o nome Zelda Zonk; levava uma peruca de cabelo preto, óculos de sol escuros e um casaco de vison preto. É possível que se tenha inspirado em Zelda Berkowitz Kaplan (1916-2012), uma socielite da noite nova-iorquina que se tornou depois uma filantropa e activista pelos direitos das mulheres, sobretudo em África onde se bateu contra a mutilação genital. 

Marilyn as Zelda Zonk.

     Ben Lyon (1901-1979), actor e executivo da 20th Century-Fox, foi o primeiro a conceder um contrato a Marilyn e terá sido também o responsável pela escolha do seu nome artístico definitivo: Marilyn Monroe. “Marilyn” terá sido escolhido por Ben Lyon, inspirado no nome da estrela da Broadway, Marilyn Miller (nascida Mary Ellen Reynolds; 1898-1936), que era actriz desde os 4 anos. A dependência do álcool acelerou a deterioração da sua saúde; morreu de complicações surgidas após uma cirurgia ao nariz para resolver persistentes crises de sinusite, quando tinha apenas 37 anos. “Monroe” terá sido escolhido por Marilyn por ser o nome de solteira da mãe.

Marilyn Miller, by Adolf de Meyer.

 

*************************************************

QUEM QUER SER MARILYN?


     O texto de Nascimento Rosa apresenta uma Marilyn em busca de um estereótipo, a Marilyn construída pela indústria cinematográfica e pelos media. Mas o que faz os estereótipos, os padrões, os modelos? O visual, a pose, os trejeitos de Marilyn já foram milhares de vezes imitados, mas parece faltar sempre algo. O que falta é a própria Norma Jean, com a sua história de vida e a sua personalidade particular. Sem Norma Jean não haveria Marilyn. Apesar de toda a artificialidade, o estereótipo Marilyn tem muito de humano e único, tornando impossível a corporização do modelo em novas intérpretes. É possível uma aproximação visual, uma réplica da pose, até das expressões faciais ou do modo de andar, mas isso não chega. Além disso, Marilyn construiu a sua própria personagem, inspirada noutras actrizes, mas também em si mesma. Em Marilyn combina-se a artificialidade e a naturalidade como se uma fizesse parte da outra e fossem indissociáveis. 

     No texto dramático de Nascimento Rosa, Marilyn aparece como uma pretendente a substituta da verdadeira Marilyn e, de algum modo, preencher um vazio deixado na vida da mãe. A mãe, afectada pelas agruras da vida, sucumbe ao abandono, minada pela instabilidade mental, vê-se incapaz de desempenhar plenamente as suas funções de mãe. O “reencontro”, anos depois, entre esta Marilyn, substituta da Marilyn já morta, e a mãe ainda viva serve de pretexto para relembrar bons e maus momentos, qualidades e vícios, para fazer acusações e contra-acusações, mas também para ambas se redimirem. 

     O registo quase senil da mãe leva a crer inicialmente que acredita que a substituta, selecionada num concurso de candidatas, é de facto Marilyn, mas as poses exageradas e ridículas de Marilyn mostram a evidência. Marilyn não pode voltar e ser quem era; e a mãe não pode ser a posteriori tudo o que não pôde ser na infância de Norma Jean. Não é a impossibilidade de viajar no tempo que impossibilita este encontro entre mãe e filha, o conserto do passado, a cura das dores; o que impede esse encontro é a própria identidade das personagens, nenhuma delas é quem diz ser. São personagens em busca das pessoas que representam. Só a memória as pode unir, a memória de Marilyn, recordada por ambas como um terceiro ser, ausente e sempre presente. 

     A título de curiosidade, registe-se que Marilyn, apesar de ter tido uma infância instável, não viveu toda a vida tão abandonada e afastada da família como se pode pensar. Existem fotografias belíssimas da sua relação com a mãe e a meia-irmã (por via materna) Berniece Baker Miracle, cerca de 7 anos mais velha do que Marilyn. Esta extraordinária senhora fez 100 anos no dia 30 de Julho de 2019! Escreveu com grande dedicação e afecto um pequeno livro intitulado My Sister Marilyn - A Memoir of Marilyn Monroe em que narra inúmeros episódios da juventude de ambas. Marilyn apenas tomou conhecimento da existência desta irmã quando ela já tinha 18 anos (1944) através de uma carta enviada pela própria Berniece. A partir do primeiro encontro, os laços fortes entre ambas nunca mais se quebraram, apesar da distância física que se acentuou quando Norma Jean se transformou em Marilyn (1946).

Berniece Baker Miracle, Marilyn Monroe's sister.

My Sister Marilyn by Berniece Baker Miracle, 1994.
Berniece, Marilyn, Gladys (their mother) and Mona Rae (Berniece's daughter).
 
     Berniece dá de Marilyn uma imagem muito diferente do estereótipo; segundo ela, Marilyn era uma pessoa simples, muito trabalhadora, nada dada a excessos, muito sociável e profissional, pelo menos quando Marilyn tinha entre 18 e 20 anos. Berniece, tal como outras pessoas próximas de Marilyn, recusa liminarmente a hipótese de suicídio. Pelo contrário, segundo Berniece, no momento em que morre, Marilyn era uma pessoa renascida, cheia de projectos para o futuro. Aliás, tinha comprado recentemente a casa onde morreu e passava grande parte do tempo a decorá-la à sua maneira. Premonitoriamente, ou não, no jardim junto à piscina mandou instalar uma pedra com a inscrição latina “cursum perficio” (“A minha viagem terminou”, “A minha viagem termina aqui” ou “Terminei a minha viagem”)… 

     Sobre a actuação das alunas finalistas do Curso de Artes do Espectáculo (Catarina Castanhas, Constança Neves e Joana Ribeiro), que interpretaram A Mãe Biológica de Marilyn Monroe, só posso dizer que tiveram desempenhos muito consistentes e promissores. A todas, desejo as maiores felicidades, na vida pessoal e profissional. 

     A encenação e direcção de actores de Gonçalo Barata foram, em grande parte, responsáveis pelo sucesso desta interpretação. Parabéns a todos pelo vosso trabalho!

A Mãe Biológica de Marilyn Monroe, photography by São Ludovino.

A Mãe Biológica de Marilyn Monroe, photography by São Ludovino.

A Mãe Biológica de Marilyn Monroe, photography by São Ludovino.
 

**************************************

A Mãe Biológica de Marilyn Monroe


Prova de Aptidão Profissional
Curso Profissional de Artes do Espectáculo - Interpretação
Catarina Castanhas
Constança Neves
Joana Ribeiro

Auditório Chaves Santos
Escola Secundária D. Pedro V
Lisboa, 28 de Junho de 2019

Dramaturgia

Nascimento Rosa

 Encenação & Direcção de Actores

Gonçalo Barata

 Intérpretes

Catarina Castanhas
Constança Neves
Joana Ribeiro

Participação Especial

José Correia
Ricardo Campos
Bernardo Ferreira

 Figuração

Carolina Martins
Teresa Ribeiro

Sonoplastia

Gonçalo Barata
Catarina Castanhas

Operação de Luz e Som

Gabriela Rubio

Grafismo

Manuela Lino

***********************************************************

Bibliografia & Webgrafia


(Da extensa bibliografia e webgrafia que compilei, fica aqui uma pequena amostra)

Bibliografia

* Marilyn: A Biography, Norman Mailer, 1973
* Marilyn Monroe - A biography by Maurice Zolotow, 1961
* Celebrity and Public Persona by P. David Marshall, 2015
* Marilyn Monroe - La femme qui voulait devenir une image by Arnauld Le Brusq, 2012
* Marilyn Monroe - the untold story of her last years by Fred Lawrence Guiles, McGraw-Hill, 1969
* Dying Like a Star - Marilyn Monroe’s life and death previewed the opioid epidemic By Robert Dorfman, Emily Berquist Soule, and Sukumar Desai in American History, August, 2018
* Marilyn Monroe A Life of the Actress by Carl Rollyson, 2014
* Marilyn Monroe - The Blonde Bombshell by Michelle Krause, 2014
* The Strange Death Of Marilyn Monroe by Frank A. Capell, published by The Herald of Freedom, 1964
* Marilyn Monroe by Joe Isinta - University of Texas at Arlington
* My Week With Marilyn by Colin Clark - Screenplay by Adrian Hodges, 2011
* Marilyn en fragments (1/3): autofictions par Christine Marcandier, Mediapart, 4 Août 2012
* The Complete Marilyn Monroe – The Cultural Analysis of an Icon of the 20th Century - Marilyn Monroe as an Artistic Icon. The Consecration of her Artistic Persona within ‘High Culture’ and the Migration of her Symbol in Eastern Europe through the Art of Sanja Iveković, Natalia LL and Vladislav Mamyshev-Monroe, 2011
* Marylin Monroe as the fragmented icon by Isabelle Van Peteghem-Tréard, 2014
* Marilyn Monroe Unveiled - A Family History by Jason Edward Kennedy (primo de Marilyn Monroe)
* Do as I say not as I do - Ralph Greenson, Anna Freud, and Superrich Patients by Douglas Kirsner
Fifth Avenue - 5:00 A.M. de Sam Wasson, 2010
* Some like it hot – Me, Marilyn and the Movie - My memories of Marilyn Monroe and the making of the classic movie by Tony Curtis, 1925-2010, Virgin Books, 2009 - https://archive.org/details/somelikeithotmym0000curt/page/n3/mode/2up

Webgrafia
* Cursum Perficio – (O melhor site sobre Marilyn)
- http://www.cursumperficio.net/Index.html

* Berniece Baker Miracle – http://www.cursumperficio.net/FicheAM34.html

* Qui est Berniece Baker Miracle, la grande soeur de Marilyn Monroe, âgée de 100 ans? - 8 août 2019 – Femme Actuelle – Le Mag -https://www.femmeactuelle.fr/actu/news-actu/qui-est-berniece-baker-miracle-la-grande-soeur-de-marilyn-monroe-agee-de-100-ans-2082126

* Berniece Baker Miracle – My Sister Marilyn - https://wonderful-marilyn-monroe.skyrock.com/tags/ebkpqecM1oo-1946_5.html

Documentos

* Marilyn Monroe FBI Files -https://archive.org/details/MarilynMonroeFBI/MONROE

* Mystery still lingers on Marilyn Monroe – CIA -Central Intelligence Agency- https://archive.org/details/CIA-RDP90-00552R000605700081-6

* FBI Frank Sinatra File Rat Pack Las Vegas - https://archive.org/details/fbi-frank-sinatra-file-rat-pack-nwo-illuminati-freemasons

* Central Intelligence Agency - https://archive.org/search.php?query=creator%3A%22CIA%22

* Federal Bureau of Investigation - https://archive.org/search.php?query=creator%3A%22FBI%22

***********************************************************************

FRAGMENTOS DE UMA VIDA

Norma Jeane Baker / Marilyn Monroe as a baby - 1/6/1926 - 5/8/1962.

Norma Jeane Birth Certificate, 1926.

Norma Jeane Baker, c. 1927.

Norma Jeane Baker, c. 1928.

Norma Jeane poses with her animal friends in 1933.

Marilyn with her grandmother, Della Mae Hogan, and her mother, Gladys Monroe.

Della Hogan, right, and sister Myrtle, around 1890. 
Della Hogan was Berniece's and Marilyn's grandmother.

Berniece and Marilyn, sisters.

Robert Kermitt Baker (half-brother of Marilyn with Gladys Pearl Baker, their mother), 1918-1933.
Este meio-irmão de Marilyn morreria pouco depois de esta fotografia ser tirada, com apenas 15 anos.

Gladys Pearl Monroe Baker com Norma Jeane (em baixo à esquerda), Robert Baker 
e outros membros da família, c. 1929.

Norma Jean and her mother at the beach.

Norma Jeane as a young girl.

Berniece, Marilyn, and Gladys, their mother at the beach.

Berniece and Norma Jeane with Gladys, their mother.

Norma Jean in a High School picture.

Gladys Pearl Monroe Baker, 1902-1984.

Gladys Pearl Monroe Baker, 1902-1984.

Norma Jean Dougherty - Notes from the Blue Book Modeling Agency.
Marilyn tinha 19 anos (1945) e usava o apelido do primeiro marido, James Dougherty.
Esta é a sua ficha de identificação na agência de modelos Blue Book.

Norma Jeane Baker - Blue Book Models.

Norma Jeane Baker - photography by Joseph Jasgur, 1947.

Norma Jeane and James Dougherty, 1921-2005.
James Dougherty casou com Norma em 1942, quando ela tinha apenas 16 anos.
O casamento terminou em 1946, sobretudo por dois motivos: Norma Jean nunca revelou
ao marido que era modelo fotográfico (trabalhava na Blue Book Agency), ele descobriu 
por acaso quando viu fotografias da mulher em revistas e pediu-lhe que abandonasse a profissão; 
e também porque Norma Jeane estava a iniciar a carreira cinematográfica e tinha ambições maiores
do que ser esposa e mãe de família. Mais tarde, James Dougherty tornar-se-ia escritor.

Marilyn Monroe US ID Card.
Em 1954 assinava Norma Jeane DiMaggio, usando o apelido 
de Joe Di Maggio, o seu segundo marido.

Marilyn with Joe Di Maggio, her second husband, between 1954 and 1955.

 
Marilyn Monroe - Certificate of Conversion to Judaism - July 1, 1956.
Marilyn converte-se ao Judaismo quando casa com Arthur Miller,
que era judeu.

Ketubah, Jewish prenuptial agreement, dated July 1, 1956.

Marilyn and Arthur Miller, her third husband, 1956-1961.

My Wife Marilyn by Arthur Miller - LIFE Magazine, December 22, 1958.

Robert Slatzer - he claims to have Married Marilyn, but they had the marriage annulled.

Robert Slatzer escreveu um livro sobre a sua relação com Marilyn.
Existem vários testemunhos dessa relação, incluindo fotografias (algumas de 1952, tiradas durante as filmagens de Niagara), postais e bilhetes dirigidos a Robert Slatzer, assinados por Marilyn.

Card of membership of the American Federation of Television and Radio Artists, in 1962.

Certificate of Marilyn’s membership of the Hollywood Museum Associates, dated April 19, 1962.

Marilyn com George Cukor, o realizador de Something's Got to Give de 1962.
O último filme de Marilyn, várias vezes interrompido e nunca acabado.

Norma Jean, 1926-1962.

Marilyn, a imagem.

Marilyn, o desencanto.

Marilyn lembrando Norma Jean (Milton Greene, 1956).

"A candle in the wind" (phot. by Milton Greene).

Marilyn: Something's Got To Give
(Documentário sobre o making of de Something's Got To Give,
o último filme de Marilyn Monroe, 1962).